sexta-feira, 25 de abril de 2014

tupperware

nunca concordei com essa coisa de tampa da panela e metade da laranja, pra mim amor é uma gaveta da cozinha cheia de tupperware.
no começo você ainda insiste em achar a tampa única e original de cada pote, o tempo passa e a gente desiste rápido, compramos vários potes da mesma marca, achando que são idênticos e hão de encaixar perfeitamente, ilusão.
as tampas vão sumindo, os potes vão rachando, uns vão embora com uns amigos, bolos e docinhos de festa dentro, uns vem de outros com quitutes e acabam ficando.
percebe-se que os potes encaixam em outras tampas, de outras marcas, e até aquele que te trouxeram da argentina de presente anda tão feliz com a tampa da marinex. outros que fecham com uma folguinha e algumas divergências mas funcionam também.
todos tentamos e insistimos em encaixar algumas tampas várias vezes em potes que nunca encaixarão, faz parte. e não há desespero se não encontrar nenhuma tampa que encaixe, existem potes de sorvete, formas, papel alumínio, saquinhos plásticos e sempre dá pra fechar um pote com um papel filme.

o amor é uma gaveta da cozinha cheia de tupperware.

segunda-feira, 21 de abril de 2014

avião

cheguei três horas antes do voo, aeroporto me deixa ansiosa, quarenta minutos no ar, em contas incertas: é quatro vezes e meia maior a espera, penso se a vida não é isso de esperar, esperar, esperar.

aprendi com a minha mãe a fazer palavra cruzada e mascar chicletes de canela, passatempo e companhia de poltronas e grandes saguões, viajar e vigiar as malas, tentar não observar as pessoas descaradamente, apesar da curiosidade tamanha.

sempre achei pilotos seres um tanto prepotentes achando ok colocar centenas de pessoas dentro de um negocio pesadíssimo de ferro que cismou de voar, não há contas, equações, princípios da física que me convençam que é normal e não mágico, é mágico.

comida de avião me dá gases e muita sede, não é triste partir, não é triste chegar, somos todos mais humanos depois do portão de embarque. tem tanta gente sozinha em aeroportos, rodoviárias, estações de trem, penso se viajar não é reaprender a ser só pra ser mundo.

faz pouco tempo que aceitei a ser ímpar, tinha terror a solidão assistida, sempre achei que nasci pra ser manada, rebanho,cardume, par, felicidades são intervalos de solidão compartilhada. hoje eu vou ao café e ocupo uma mesa de dois, eu como comigo, ocupo uma cama pra dois em um, eu durmo comigo, aprender a ser companhia de si antes de se propor a acompanhar alguém.

e ir assistir sozinha aquele filme daquele diretor esquisito as vezes te faz conhecer um moço, também sozinho, de risada gostosa e com o mesmo gosto cinematográfico duvidoso que você, ou escapar pra comer aquele bolo de laranja num café que só você gosta, te faz conhecer uma senhorinha que morou na cidade da sua vó e que resolve te dar um brinco lindo de pressão antiga, azul de concha.

viver é bom, partida e chegada, solidão, que nada.

terça-feira, 8 de abril de 2014

praga

te dei soco no estômago, tapa na cara, sapateei no seu calo, quebrei teu nariz, xinguei sua mãe e seu pai, amaldiçoei  todos os antepassados e os seus que virão, queimei suas roupas, chutei o seu saco, cuspi nas suas cartas, desprezei seus amigos, escondi seus sapatos, incendiei sua casa, praguejei os seus planos, reneguei os seus sonhos, dei de maldizer as coisas lindas que você é, que você fez, que você foi, pra ver seu deixava de te amar,  pra ver se eu te deixava amar, pra ver se você deixava de me amar.